Os 7 erros da nova marca do turismo do Brasil
Os 7 erros de ‘Brazil. Visit and love us’
Sei que este texto aqui não vai dar em nada. E, francamente, perto de outras coisas que estão acontecendo, este é um assunto menor.
Mas por ter trabalhado tanto tempo em publicidade (fiz umas coisinhas aí que talvez você conheça) e estar há 21 anos metido com turismo, não posso deixar de me manifestar sobre o novo slogan e a nova marca Brasil anunciados pela Embratur.
Conversei com angloparlantes nativos, especialistas em promoção turística e publicitários, e trouxe exemplos para ilustrar a minha opinião.
O texto ficou gigante, então aqui vai um índice clicável para quem se perder pelo caminho.
- 1. O slogan não soa fluido em inglês
- 2. O slogan não significa o que a Embratur acha que signifique
- 3. “Us” não é um pronome que se use para um país
- 4. Não se usa “amar” no imperativo em publicidade
- 5. Tem conotação sexual, sim
- 6. A nova marca é um retrocesso
- O “z” é importante, mas não precisa estar na marca
1. O slogan não soa fluido em inglês
Antes mesmo de examinar seu significado, deve-se dizer que “Brazil. Visit and love us” é uma frase que soa estranha. Não é que esteja errada — só não é escorreita. OK, não precisa googlar ‘escorreito’: é uma frase que está longe de ser redondinha. Não parece ter sido escrita ou aprovada por angloparlantes nativos.
Meus interlocutores em off usaram os adjetivos “clumsy” e “awkward” (desajeitado, esquisito).
A opinião dos meus entrevistados coincide com estas duas, de um americano aleatório que respondeu a uma pergunta que alguém (não eu) publicou no Quora (um “Yahoo respostas” de gente mais preparada) e de um correspondente de uma revista sobre política e economia latino-americana no Twitter:
“O slogan que você apresenta na pergunta não funciona. Não tem impacto nem real significado para um angloparlante nativo.” (Link aqui.)
“Eu evito ser maldoso no Twitter, mas o slogan é bizarro e embaraçoso e qualquer consultor internacional — ou angloparlante nativo — poderia ter dito isso a eles.” (Link aqui.)
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2. O slogan não significa o que a Embratur acha que signifique
No momento do lançamento da nova marca, o slogan “Brazil. Visit and love us” veio traduzido no release como “Brasil. Visite e encante-se”. (Link aqui.)
“Visit and love us” não significa “Visite e encante-se”. Significa “visite e nos ame”, não há o que inventar aqui.
Esse “encante-se” poderia ser algo como, sei lá, “be amazed” (mas este verbo já é usado no slogan da Tailândia). Certamente não é “love us”.
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3. “Us” não é um pronome que se use para um país
Em publicidade, “we”/”us” são habitualmente usados por empresas. É um recurso empregado para humanizar anunciantes/corporações.
Mas não há precedentes de seu uso para um país. Vasculhei todo este atlas de slogans turísticos de países e não achei nenhum “us”.
(Link do mapa aqui.)
Quando um país usa “nós” na sua comunicação, está sim se referindo ao seu povo.
E se o slogan que você criou manda amar o povo do seu país, então esteja preparado para todas as interpretações possíveis.
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4. Não se usa “amar” no imperativo em publicidade
A publicidade não vive sem o imperativo — o verbo usado no modo que comanda uma ação do interlocutor.
O verbo neste modo serve para, digamos assim, sugerir com força: “compre”, “experimente”, “troque”, “descubra”, “aproveite”, “curta”, “ligue já”. Não há a conotação de ‘ordem’, porque são comandos que fazem parte da paisagem da publicidade desde a invenção do anúncio, e já se enfraqueceram ao longo do tempo.
Mas veja: os verbos amar, gostar, adorar (e outros, como aprovar ou ficar satisfeito) não fazem parte desse elenco. Não se usa nenhum deles no imperativo, porque seria uma sugestão forte demais. Pode parecer, sim, uma ordem.
É por isso que você não vai ver nenhum slogan como “Brastemp. Experimente e ame nossas lavadoras”, ou “Boticário. Use e adore”. Quando é para usar esses verbos, a publicidade troca o imperativo por um vaticínio — uma aposta de que o consumidor vai ficar satisfeito. Em vez de “ame”, entra o “você vai amar” (você vai gostar, você vai adorar, você vai aprovar, você não vai se arrepender, você vai se apaixonar).
O McDonald’s, por exemplo, usou o verbo amar de uma maneira bastante original, transferindo para a boca do consumidor: “Amo muito tudo isso” (e não “Peça e ame nossos sanduíches”).
“Ame” também pode ser usado como um pedido, um apelo aos bons sentimentos do receptor. “Ame a natureza, não use canudo de plástico”. “Ame as crianças com câncer, participe do Teleton”. “Ame a nossa cidade, pague o IPTU em dia”.
E em turismo? “Ame a Bahia, passe suas férias aqui” seria uma campanha justificável num contexto em que a Bahia quisesse estimular o turismo intra-estadual e de baianos expatriados. Mas para o público geral, neutro, sem vínculo emocional com o anunciante, é óbvio que “Visite a Bahia, você vai amar” funciona melhor.
Já “Bahia. Visite e nos ame” seria um slogan tão indefensável quanto “Brazil. Visit and love us”.
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5. Tem conotação sexual, sim
Nenhum anunciante responsável vai pôr um centavo numa campanha que não tiver passado por algum tipo de pré-teste. A finalidade dos pré-testes é descobrir se a mensagem será entendida pelo público da maneira que se espera.
Se há algum mal-entendido, a campanha é gongada, porque não se joga dinheiro fora numa comunicação que parte do público, ainda que minoritária, vai entender errado. Nenhum anunciante responsável vai investir numa comunicação impregnada de ruído.
É sintomático que uma das críticas mais duras ao novo slogan tenha vindo da associação brasileira de turismo de luxo, a BLTA (Brazilian Luxury Travel Association) — que, ao contrário da Embratur, usa o inglês no dia a dia dos seus negócios.
Aspas para Simone Scorsato, diretora executiva da BLTA (link aqui):
“[O slogan] é ambíguo e facilmente incompreendido, mesmo para quem fala inglês em qualquer lugar do mundo, não cumprindo, assim, o objetivo de promover, efetivamente, o Turismo de maneira positiva.”
“A BLTA não pode observar silenciosamente os gastos públicos na promoção do Turismo sem uma consideração cuidadosa da linguagem e ignorando tendências e práticas óbvias na indústria global de viagens. Essas falhas estão custando aos brasileiros empregos de qualidade e crescimento econômico sustentável a longo prazo.”
“[A BLTA solicita que a Embratur] retire imediatamente o slogan e comece a explorar alternativas que não deixem em aberto possibilidades passíveis de interpretação errônea”.
É interessante acrescentar aqui outra resposta aleatória à pergunta que publicaram no Quora, de um americano que já veio ao Brasil seis vezes:
“[…] Não fizeram nenhum ‘focus group’ [pré-teste] antes? […] De fato, é um slogan abstrato demais para evocar imagens ou experiências, exceto que sim, turismo sexual logo vem à mente, devido às palavras escolhidas. Mas já que a prostituição é legal lá, será que não é um aspecto [intencional da frase]?” (Link aqui.)
A reação da Embratur às críticas é terraplanista (link aqui):
“Quanto às alegações que o slogan poderia ser considerado um incentivo ao Turismo sexual, a Embratur afirma que não há sentido em fazer essa ligação.
O Instituto frisa que o governo brasileiro não reconhece a expressão ‘Turismo sexual’, e reforça que a exploração sexual não é Turismo, é crime.
Nós queremos que as pessoas venham e amem o Brasil. Amem as nossas praias, cachoeiras, nosso Turismo náutico, de pesca, de mergulho, o Turismo de negócios e eventos, a nossa gastronomia, cultura e esporte.”
Quem deve dizer se a mensagem tem ou não tem esta ou aquela conotação não é o emissor. É o receptor. Está totalmente fora do alcance do emissor controlar o entendimento do receptor. Publicidade não vem com manual de instruções, nem com um personal explicator para explicar a mensagem, receptor por receptor. Se o receptor entende a mensagem de uma maneira diferente da pretendida pelo emissor, o emissor vai precisar investir numa nova comunicação para desfazer o mal-entendido. Release para a imprensa não resolve.
Mas a Embratur ainda consegue tirar um argumento surreal da cartola: não há conotação sexual porque nós, autoridades, não reconhecemos a existência de turismo sexual. Aliás, exploração sexual é crime!
Há dois problemas aí: turismo sexual existe, sim. No Brasil e em todo lugar.
Veja o que diz o empresário Oscar Maroni, dono do estabelecimento Bahamas, em São Paulo: (link aqui)
Além disso, turismo sexual não é crime no Brasil — quando praticado consensualmente entre pessoas maiores de 18 anos, sem intermediários que configurem a “exploração”.
E cá entre nós: se esse “love us” é tão maravilhosamente amplo como a nota apregoa (inclui até “queremos que amem o turismo de negócios”), por que cargas d’água não incluiria o turismo sexual?
O próprio presidente já declarou que “quem quiser vir aqui fazer sexo com uma mulher, fique à vontade” (link aqui“).
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6. A nova marca é um retrocesso
Tem tanta coisa aqui nesta parte que precisei dividir em três subtópicos.
- Considerações sobre a nova marca
- Qualidades e limitações da marca antiga
- Marcas e slogans que deveríamos mirar
Considerações sobre a nova marca
A nova marca Brasil constrange o design brasileiro. Ela está para uma marca de verdade como uma live de Facebook está para um comercial propriamente produzido.
Foi orgulhosamente anunciada como tendo sido feita internamente, em prazo récorde, economizando dinheiro público. Todas essas qualidades estão bem evidenciadas no resultado: é amadora, mal-acabada e pobre.
O nível é tão pouco profissional que, “para economizar”, foi usada uma fonte gratuita. Só que o autor não autoriza o seu uso comercial. (Link aqui.)
A bandeira brasileira foi escolhida para estampar a marca porque segundo a Embratur, é o maior símbolo nacional, e o mais conhecido no exterior. “Nossa natureza, nossos esportistas, a música, a comida, todos estes pontos da cultura nacional levaram nossa bandeira lá fora, com muita maestria”. (Link aqui.)
Reflita: nossa natureza levou nossa bandeira lá fora? A música levou nossa bandeira lá fora? A comida levou nossa bandeira lá fora? Nossos esportistas… tem bandeira do Brasil na camiseta da Seleção? Não me lembro.
Na verdade, só quem leva a bandeira nacional lá fora com maestria são as Havaianas. E por sinal, a bandeira brasileira numa tira de chinelo associa ao Brasil uma miríade de sensações positivas: sol, praia, ar livre, movimento, descontração, alegria. Cada par de Havaianas com bandeirinha vendido no exterior é uma propaganda grátis do Brasil.
Já a bandeira nacional aplicada como mero símbolo cívico na nossa marca de turismo não acrescenta absolutamente nada ao que o lettering já informa: trata-se de uma marca do Brasil. Uma escola de contabilidade chamada Brasil poderia usar a mesmíssima bandeira no seu logotipo, que não ficaria estranho.
Ah, sim: o release ainda explica que o redesenho da bandeira foi inspirado na rosa dos ventos.
Com vocês, Rosa dos ventos x Rosa dos ventos estilizada da Varig x “rosa dos ventos”, entre aspas, da nova marca Brasil.
É preciso explicar ao receptor que a bandeira da marca Brasil é uma rosa dos ventos estilizada. Mas não é preciso explicar ao receptor que a bandeira da marca Farmácia Popular contém um comprimido. (Aliás, que bela marca! Duvido que tenha sido feita internamente pelos servidores do Ministério da Saúde.)
Lembrei de duas outras marcas, dentro do mesmo universo cívico-patriota, que conseguem passar noção de direção e movimento (o que, acredito, deve ter sido o ponto de partida da rosa dos ventos):
Governo do Distrito Federal e Projeto Rondon (o logo original era esse que está dentro do zero dos 50 anos)
Sem falar que a própria Embratur aproveitava uma bandeira brasileira no seu logotipo, de maneira muito melhor — a bandeira se tornava mata, areia e mar. Consegui localizar essa bandeirinha em materiais desde 1978.
Este anúncio da Varig, de 1997, dá vida a essa idéia. Foi criado pela Young & Rubicam (diretor de arte: Rodrigo Butori) a partir de uma foto de Cássio Vasconcellos.
Já este anúncio é mais antigo, de 1986. Criado pelo saudoso Tomás Lorente, na DPZ, para a Fundação S.O.S. Mata Atlântica.
É usado até hoje como marca da fundação. (Infelizmente, é uma imagem cada vez mais atual.)
Qualidades e limitações da marca antiga
A marca Brasil anterior é de 2004. Foi fruto de um riquíssimo trabalho de planejamento, o Plano Aquarela.
O plano fez um excelente diagnóstico da situação do Brasil no turismo internacional e de como explorar o potencial de crescimento do Brasil. Muitos de seus insumos continuam válidos até hoje.
A escolha da marca foi feita por um concurso feito em parceria com a Associação dos Designers Gráficos do Brasil. Ganhou um belo trabalho de Kiko Farkas. Jogue a marca Brasil antiga entre outras marcas de promoção turística, e ela salta aos olhos: é muito bonita.
Apesar de tudo, eu não sou fã do resultado final. Não culpo o designer, mas o briefing. A referência usada para pautar os concorrentes foi um jardim de Burle Marx. Isso encaminhou a marca para um nível de abstração e sofisticação que funciona melhor numa galeria de arte do que em comunicação de massa.
Tenho também um pouco de implicância também com o vermelho e o laranja, que fogem à nossa paleta de cores e parecem estar ali como concessão, ou agrado, ao cliente — estou chutando, não conheço os bastidores da história, não.
(O pior é que eu intuo que a pressa em fazer uma marca nova se deve à paranóia de ter um símbolo pátrio com uma manchinha vermelha. Na nota da Embratur a marca é descrita como uma “ameba vermelha”. Chamar de ameba é do jogo — já era a maldade preferida dos detratores quando a marca foi adotada. Agora: “ameba vermelha”, pelamor.)
Na minha opinião, a marca seria mais efetiva, comunicaria melhor, atingiria um público mais amplo se fosse mais óbvia, se tivesse um significado identificável pelo receptor médio.
(Imagine um lettering Brasil desenhado pelo Romero Britto ou pelo Eduardo Kobra. É isso que eu chamo de apelo universal imediato. 150% de aproveitamento da comunicação.)
O slogan também não ajuda. “Brasil – Sensational!” é um primo pobre de “Incredible India” e “Amazing Thailand”, sem a força de nenhum dos dois. (‘Sensational’ é um adjetivo pouquíssimo usado em inglês, soa português traduzido.)
Veja: o ‘Incredible India’ comunica todo o mistério da Índia num pingo do ‘i’.
Já o ‘Amazing Thailand’ entrega um sorriso. (Um dos apelidos do país é “a terra dos mil sorrisos”.)
Mesmo com todas essas observações, tenho convicção de que a marca anterior tem grandes vantagens com relação à que está sendo proposta agora. É a um só tempo elegante e lúdica. Não leva a interpretações dúbias. A associação de turismo de luxo nunca emitiu uma nota dizendo que seus clientes estrangeiros vão entender que no Brasil podem contrair amebas vermelhas.
Na falta de uma solução óbvia e popular, é mil vezes preferível uma marca sofisticada a uma marca tosca.
Marcas e slogans que deveríamos mirar
Mas se eu não amo a marca Brasil anterior, por que estou gastando o meu e o seu tempo reclamando da marca nova? Porque se é para mudar, que se mude para uma marca que realmente faça a diferença.
O benchmark, o caso de sucesso que deve servir de parâmetro, o exemplo que deve ser batido é esse aqui:
A marca Peru.
Inspirada nas linhas de Nasca, a marca Peru é intransferível, impactante, sintética, vibrante. Tem punch. Tem significado. Não requer personal explicator. Foi lançada em 2011, não apenas para promoção turística, mas também para identificar produtos made in Peru. (A marca Brasil anterior também tinha essa intenção, mas nunca se materializou.)
A marca Peru deu tão certo que virou souvenir. Os turistas compram bugigangas com a marca Peru como quem compra miniaturas da Torre Eiffel em Paris. A marca realmente virou um símbolo do Peru. E certamente teve sua influência no espetacular aumento do turismo estrangeiro no país — de 2,5 milhões em 2011 para 4,4 milhões em 2018, um crescimento de quase 80%. (O Brasil foi de 5,4 milhões em 2011 para 6,6 milhões em 2018, um aumento de menos de 25%.)
Qualquer nova marca que seja cogitada hoje deve ser examinada à luz da marca Peru. É tão boa quanto a marca Peru? Não é? Pois então não serve. Próxima!
A marca Peru é tão boa que vingou sem a ajuda de um slogan. Mas não se deve ignorar o potencial de um bom tema de campanha.
Alguns slogans excepcionais, que deveriam servir de parâmetro para medir a força e a qualidade de qualquer frase que seja proposta pelo Brasil:
‘Costa Rica, sem ingredientes artificiais’. Na mosca. Posicionou a Costa Rica como um paraíso rústico e selvagem. Tornou-se o destino de natureza preferido pelos americanos na América Latina.
‘Colômbia, o único risco é você querer ficar’. Corajoso e brilhante. Ajudou a reinserir a Colômbia no mapa do turismo, depois do fim da guerrilha. (Hoje a campanha tem o tema ‘Realismo Mágico’, que é interessante mas um pouco mais intelectual.)
‘100% pura Nova Zelândia’. Uma campanha longeva, de enorme sucesso. As fotos já são naturalmente deslumbrantes, e a frase turbina o efeito no receptor.
‘Inspirado pela Islândia’. Um dos maiores casos de crescimento de turismo dos últimos anos também está alicerçado num conceito simples e poderoso.
‘México, viva para acreditar’. Não é nenhum ‘sem ingredientes artificiais’, mas é uma mostra de como um país não-angloparlante pode criar e aprovar um slogan que soe gostoso em inglês. “Live it to believe it” tem graça e ritmo (duas coisas que faltam ao “Visit and love us”).
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O “z” é importante, mas não precisa estar na marca
O Plano Aquarela recomendou que se usasse Brasil com ‘s’ na marca internacional. Não tenho nada contra. Vários países usam as grafias originais de seus nomes nas suas marcas de promoção turística.
O problema é que a Embratur levou esse raciocínio também aos textos. E começamos a escrever no nosso material promocional coisas como “Come to Brasil” e “Brasilian people”. Isso não existe.
Em inglês, Brasil se escreve Brazil. Assim como em português, Uruguay se escreve Uruguai, Ecuador se escreve Equador, Perú se escreve Peru e Colombia tem chapeuzinho: Colômbia. Um americano que escreva ‘Brazil’ em vez de ‘Brasil’ está sendo tão imperalista quanto você quando escreve ‘paraguaios’ em vez de ‘paraguayos’.
Mas o problema não parou aí. Por causa dessa patriotada, deixamos escapar domínios importantíssimos de brazil com z. O turismo brasileiro não é dono de visitbrazil.com, nem de brazil.info, nem mesmo de brazil.travel (os domínios .travel foram lançados já com a internet madura e o brazil.travel poderia ter sido comprado pela Embratur antes de cair na mão de um aventureiro).
Ficamos só com o visitbrasil.com, esse híbrido nada intuitivo, que requer a ajuda do Google para chegar até ele.
Felizmente, o problema do Brasil com s nos textos em inglês já não existe desde a Embratur do governo Temer. Os “Brasil” e “Brasilian” já foram modificados para “Brazil” e “Brazilian”, para gáudio dos motores de busca, que já podem somar a quantidade de “Brazil” nos textos para oferecer a quem joga “Brazil” no Google.
Com esse ruído já resolvido, voltemos então à questão do Brazil com s ou z incorporado à marca.
Se tivermos uma “marca Brazil”, com o Brazil com z incorporado ao logotipo, vamos precisar ter também uma marca Brasil, uma marca Brésil, uma marca Brasile, uma marca Brasilien, uma marca Brazilië, uma marca Burajiro e por aí afora. Não é muito prático.
Dá para resolver muito bem com Brasil com s na marca e Brazil com z nos enunciados e textos — como já demonstrava a Espanha, um dos decanos da promoção turística no mundo:
É isso. Obrigado por ter chegado até aqui — pelo menos não perdi meu tempo sozinho.
220 comentários
Já visitei este texto aqui umas 3 vezes em um ano. Parabéns pelo teu empenho em fazer esta matéria com tanta qualidade! 👏🏻👏🏻👏🏻
Ricardo,
como recém formada em Turismo te digo: esse teu texto vale mais do que muitas aulas da graduação. QUE BAITA APRENDIZADO! Vou levar pra vida esse olhar crítico diante das marcas e dos slogans. Tu é o cara!
muito esclarecedor
Excelente texto! Obrigada por compartilhar suas ideias e opniões!
seria muito mais incrível se o slogan fosse “Please come to Brazil”.
acho que não iria soar muito bem, uma vez que a palavra “por favor
‘ iria dá uma ideia voltada para um apelo.
Excelente a reflexão, Ricardo. Não é à toa que você está ha tantos anos no turismo orientando, alertando, inspirando e cada vez mais sinto confiança em recorrer a você para buscar informações de qualidade. Quanto a marca quanta falta de sorte a nossa!! temos tantos publicitários competentes e erros básicos são difíceis de digerir, pois com algumas leituras aos manuais de criações de marcas de países iriam encontrar embasamentos para não errarem tão feio. Lamentável. Só nos resta desejar sorte e força a nós empresários do turismo.
Excelente texto! Enquanto designer sinto falta desse tipo de debate para além das rodas de conversas dos profissionais.