Jalapão: como é a viagem com a Korubo
No post anterior, Para entender o Jalapão, eu explico o que esperar da região e as diferenças entre os roteiros das principais operadoras. (Lá tem também o link para um roteiro para jipeiros que queiram ir por conta própria.) Neste novo post, conto a minha experiência de 5 dias e 4 noites no Jalapão, como convidado da Korubo, em setembro de 2012. (O pacote completo, a partir de R$ 1.980 em ocupação dupla, inclui ainda duas noites em Palmas, uma na chegada e outra na véspera de retornar. Passagens aéreas não estão incluídas.)
Dia 1
Às 9 em ponto da manhã de sábado o caminhão da Korubo estaciona em frente à Pousada dos Girassóis, que fica bem no centrinho administrativo de Palmas. Na hora eu nem notei, mas ainda não é o caminhãozão que conhecemos das fotos. Este é um veículo mais levinho, apropriado para o asfalto. O caminhão mesmo está à nossa espera 200 km adiante, em Ponte Alta.
As primeiras duas horas e meia de trajeto servem como transição para o nosso novo habitat dos próximos dias. Enquanto você roda no asfalto, a quase 80 km/h, é mais fácil se acostumar à idéia de estar num caminhão transformado em ônibus. Depois do almoço um novo grau de dificuldade será acrescentado, quando a estrada for de chão batido.
Mas não vamos pôr o caminhão na frente dos bois. Por enquanto, deixemo-nos surpreender por Taquaralto, pujante cidade-satélite de Palmas. Vinte minutos depois de deixar a aridez baldia da capital, esta cidadezinha encanta por ser… uma cidadezinha!, com tudo o que parece estar em falta em Palmas: gente nas calçadas, lojas ao lado de bancos ao lado de botecos, trânsito, vida. Acho que Taquaralto tem até árvores! Mas fiquei tão atônito que esqueci de fotografar.
A parada em Ponte Alta, a porta de entrada para o Jalapão, serve para almoçar (num quilo bem chinfrinzinho), dar os últimos telefonemas (nos próximos dias só haverá sinal de celular — Vivo — durante a hora e meia que estaremos em Mateiros), trocar de caminhão (para o verdadeiro Korubão) e incorporar ao grupo o guia Mauro, que é jalapoeiro e mora em Ponte Alta.
Pronto: voilà o Korubão verdadeiro. Além de inteiriço, vem com um mirante acima da boléia.
Depois do almoço, partimos. Os mais corajosos sobem na boléia mesmo com o sol ainda a pino. A velocidade máxima baixa para os 30 km/h, de onde não passarão até voltarmos ao asfalto, daqui a quatro dias.
Mais ou menos uma hora da saída acontece a primeira parada: a gruta, ou canyon, ou cachoeira, ou vereda de Sussuapara. Acabei registrando na memória como “vereda”, por ser na época um conceito inédito para mim, então neófito no turismo pelo interior do Brasil. Veredas são fendas em torno de nascentes onde brota densa vegetação; verdadeiros oásis do cerrado. Esta de Sussuapara vem com uma cachoeira de brinde. E dá o tom do que nos espera no Jalapão: lindas surpresas escondidas na imensidão do cerrado — e sempre a uma considerável distância de onde quer que tenhamos saído.
Da vereda ao acampamento são pouco mais que mais duas horas de viagem — os últimos vinte minutos por uma estradinha de areia que sai da estrada principal. Chegamos ainda com luz natural suficiente para aprender a localização das barracas, dos banheiros e do restaurante. Quem quisesse desafiar as mutucas do entardecer poderia entrar na prainha do rio. (Preferi um banho de chuveiro mesmo.)
Ao primeiro sino anunciando o jantar, eu já estava à mesa. Caí duro na cama cedinho. Lição do primeiro dia: andar de caminhão cansa.
Dia 2
Assim como o caminhão, o acampamento (nome oficial: safari camp) é um atrativo da viagem da Korubo. Você vai passar 90% do tempo dentro de um ou do outro, então precisa ir preparado para isso.
Montado desde 2001 à beira de um aprazível trecho do rio Novo, o acampamento funciona que é uma beleza. Só não espere o luxo dos safari camps da África do Sul.
As barracas são arejadas (e se você vier no meio do ano, durante a seca, vai precisar se cobrir à noite). Todas são “suítes” — isto é, têm toalete e pia próprios. Cadeirinhas de diretor transformam a frente numa varanda. Um varal está conveniente armado nos fundos. Os banheiros de tomar banho são amplos e têm vários chuveiros privativos — não rolou fila em nenhum dos dias da minha estada.
A comida, a cargo do paraense Nelson (o único não-jalapoeiro da equipe), é uma unanimidade: todos elogiam. Cada passageiro ganha uma caneca no primeiro dia; como sempre há um bebedouro disponível ou um galão de água gelada a bordo do caminhão, não é preciso carregar (nem descartar) garrafinhas de plástico.
Celular não pega, mas há tomadas suficientes para recarregar as baterias das câmeras e iPods.
E a lojinha de artesanato de capim-dourado tem peças lindas (a receita da venda é repassada integralmente aos artesãos, segundo a Korubo).
Boa parte do segundo dia é passada no acampamento. De manhã são distribuídos caiaques, e alguns de nós (presente!) fazem o primeiro rafting de suas vidas. A saída é na prainha do safari camp, e o percurso é bem café-com-leite — mas para quem não tem força no braço, como eu, o esforço é sério.
Como já mostrei aqui, fui o único a cair no ponto oficial para fotografia (talvez o meu maior mico que já tenha sido registrado por uma câmera).
Depois do almoço temos um tempinho para nos entregar ao torpor no redário (nas barracas é impossível ficar a essa hora do dia). E então, no meio da tarde, partimos para o cartão-postal do Jalapão: o pôr do sol na duna.
O caminho é lindo. À medida que vamos avançando, a Serra do Espírito Santo vai ficando mais prominente. Com o sol baixando, os quatro lugares da boléia começam a ser disputados.
Mas não tenha pressa: faremos esse caminho mais duas vezes, todo mundo vai ter sua vez.
Lá pelas tantas, uma paradinha estratégica para ver o capim-dourado no seu habitat. A colheita é feita na terceira semana de setembro; nosso grupo pôde ver o capim já seco e dourado pela estação seca, prestes a ser colhido.
A duna fica a uma hora e pouco de viagem do acampamento; o caminhão chega na hora mais propícia para subir sem muito esforço e fotografar os efeitos do pôr do sol na lagoa. Como expliquei aqui, a duna é resultado da erosão de uma das faces da Serra do Espírito Santo.
É um atrativo pontual — e não uma paisagem que se repita por todo o Jalapão. Então aproveite para tirar todas as suas fotos ;D
Quando estamos de volta ao acampamento, já é noite alta.
Dia 3
A segunda-feira é o dia mais divertido do passeio. “Caneca, boné, câmera, protetor solar, repelente, chinelo” são as instruções do guia Mauro ao fim do café da manhã.
O Mauro é figuraça — desses sujeitos que são naturalmente engraçados. Fala como matuto, sem plurais nem concordância verbal, mas pontifica em qualquer disciplina: história, geologia, botânica, zoologia, política. Esperto, está sempre pendurado num livro — que é o melhor companheiro para os longos trajetos. Depois de “use filtro solar”, este é o melhor conselho que eu posso te dar: leve um ou dois livros. Ou música. Ou grandes planos para resolver na cabeça, enquanto o cerrado passa pela janela.
O primeiro trecho do passeio do dia leva mais de duas horas. Passamos pela Serra do Espírito Santo (oi! você por aqui!), damos uma imbicadinha em Mateiros e já saímos.
A primeira parada é no Fervedouro, o mais famoso dos poços do Jalapão onde ocorre o fenômeno da ressurgência: água que brota num solo de areia finíssima que, ao ser revolvida, impede que você afunde. É como uma areia movediça, só que ao contrário. Apenas seis pessoas podem entrar de cada vez, permanecendo quinze minutos. Não importa quanto você pese: não dá pra não boiar. Incrível, senhoras e senhores.
De lá vamos para outro fervedouro, ali pertinho. Esse não tem limitação de visitantes; podemos entrar todos juntos.
A terceira parada, menos de quinze minutos adiante, é a mais divertida de todas. A Cachoeira do Formiga (do rio Formiga, por isso está no masculino) é daquelas que valem por um parque aquático. A temperatura da água é deliciosa; a piscina formada pelas pedras tem áreas com e sem emoção — e o que é esse verde-esmeralda?!?
(Dica: aproveite para tirar o resquício de areia fina dos fervedouros, ou ele vai grudar na sua roupa de banho até o fim da viagem.)
Depois do almoço — servido ali mesmo, no Formiga — vamos a Mateiros, a sede do município que concentra mais atrativos do Jalapão. (Outras operadoras levam a Mumbuca, o povoado que é o principal produtor de artesanato de capim-santo, onde se pode visitar os artesãos.) Em Mateiros há uma grande loja que vende o artesanato da região. Se o seu celular é Vivo, é a sua chance de usar. (Tem também um orelhão na praça.) Nosso grupo tomou conta da sorveteria e acabou com o estoque de picolé.
Dali até o acampamento são duas horas. Cadê meu livro?
Dia 4
Dia de madrugar. O objetivo da manhã é escalar a nossa já conhecida Serra do Espírito Santo. Como isso só é factível antes do sol estar a pino, é preciso sair antes do amanhecer.
O percurso de caminhão leva uma hora; a subida, outra hora, devagarinho.
Lá em cima, uma trilha de quinze minutos no plano leva ao mirante onde o Jalapão vira dublê da Chapada Diamantina.
Perto das 10 da manhã, quando começamos a descida, descobrimos por que não há trekking no Jalapão: só dá para caminhar debaixo do sol no começo ou no fim do dia.
À tarde, depois de um breve day-use do redário, tem mais um momento recreação no rio: vestindo coletes salva-vidas, andamos meia hora pela margem e voltamos levados pela correnteza. Quem gostou, repetiu.
É a última noite no acampamento, e por isso, depois do jantar, tem fogueira de despedida. Além das piadas do Mauro (que nem precisa levantar da cadeira para fazer stand-up), nosso grupo teve direito a um showzinho de dois casais mineiros que levaram violão (coisa finíssima).
O grupo, por sinal, era muito bacana: gente com mais de 30 anos (alguns com mais de 50), nenhum engraçadinho-inconveniente de plantão. Se todos os grupos forem assim, tá beleza…
Dia 5
O caminho da volta é mais longo que o da vinda, porque inclui um desvio até a Cachoeira da Velha. Majestosa, em forma de ferradura, com passarelas que servem de mirantes, a Cachoeira da Velha é só para olhar: a queda é tão poderosa que não dá para entrar n’água.
O momento-refrescância acontece um pouco adiante, numa prainha do Rio Novo. Ali dá pra tomar banho, nadar, tomar sol (ou ficar na sombra). O último almoço — trazido do acampamento em contêineres — é servido por ali.
Da Cachoeira da Velha são duas horas até Ponte Alta, onde trocamos de caminhão e voltamos para o asfalto. Asfalto! A sensação é de ter ganho um upgrade da econômica para a executiva.
No último trecho da volta o pessoal já vai combinando o programa da última noite em Palmas. A maioria decide por um peixe assado no Tabu.
Balanço final
O Jalapão é um troféu no currículo de qualquer viajante. Um lugar de difícil acesso e pouquíssimo visitado. Não é invadido nos fins de semana e feriados pelo pessoal da capital, nem teve o território desfigurado pela agricultura ou pecuária.
Os atrativos são belíssimos — mas distantes entre si. Por isso, prepare-se para as longas jornadas, e encare as condições peculiares da viagem (no caso da Korubo, o caminhão e o acampamento) com espírito de aventureiro.
Que outra oportunidade você vai ter de viajar sentadinho no teto de um caminhão ou acampar à beira-rio sem precisar montar nem desmontar barraca? Eu curti
*Ricardo Freire fez a parte terrestre a convite da Korubo.
[Transcrito manualmente de um post publicado em julho de 2013. Pedimos desculpas pelos comentários que não puderam ser transferidos]
Leia mais:
- Para entender o Jalapão
- De Brasília ao Jalapão, via Veadeiros, de jipe: o relato do Edison
- Escolha sua Chapada: Diamantina x Veadeiros x Guimarães x Mesas x Jalapão
30 comentários
Oi Bóia, tudo bem? Antes de mais nada, manda um abraço pro Riq! Seguinte: rola passar o Reveillon no Jalapão? Chuva? Vcs por acaso indicam alguma operadora além da Korubo? Temos 10 dias de férias e a ideia é ficar lá do dia 26 ao dia 4. Muito tempo? Bjos!
Olá, Alexandre! Essa viagem foi feita há 11 anos. Atualmente o esquema de visita mudou muito, o que predomina são circuitos pela região com hospedagem picadinha em pousadas mais próximas aos atrativos. A chuva não atrapalha como em destinos de praia.
Nos comentários deste post há indicações de agências por parte de leitores:
https://www.viajenaviagem.com/jalapao-dicas-roteiro/
Oiii, tudo bem? Eu tive um AVC , há 2 anos e meio, mas eu me viro muito bem! Vcs acham que é uma boa pedida?
Olá, Bianca! A única questão do Jalapão é a distância de hospitais. Converse com o seu médico.
Olá! Grato pela resposta de poder ir mesmo no período das chuvas.
Outra questão. Iria minha namorada (68) e eu (53).
Vc recomendaria escolher uma agência com veículos 4×4 com mais conforto e ar, pernoitando nas pousadas das diferentes localidades ou ficar naquele camping e ônibus/caminhão?
Imagino que na 4×4 teria maior conforto mas menor animação. Talvez se tiver sorte com os outros integrantes. Já no caminhão/ônibus , por ter maior número de pessoas, se pode ter maiores chances de animação.
O que vc acha?
Olá, Marco! Esse esquema da Korubo hoje já não vale mais a pena, porque já existe uma outra logística de dar a volta ao parque. INfelizmente não temos conteúdo sobre essas expedições, está na nossa lista.
Será que vale a pena arriscar de ir no início de Dezembro? Época das chuvas?
Olá, Marco! Pode ir.
Parece ser um lugar muito bonito..pretendo ir um dia
Oi Ju, fez o passeio mais recentemente? Como foi? Pergunto pois ha reclamações severas à empresa no Reclame Aqui. Estou querendo ir em fevereiro e estou hesitante.
Obrigada Ricardo pelo blog sempre completo!
Abs
Olá, Marcia! Quem responde é a Bóia. O passeio foi feito em 2013. Na época, a Korubo era a melhor opção, disparado. De lá para cá a situação no Jalapão mudou bastante, com muitos novos operadores, pousadas e também atrativos. Acredito que seja melhor fazer um circuito com estada em várias bases, reduzindo o vaivém ao acampamento, que é o maior problema do esquema da Korubo.
Adoro seus posts. Sigo muito suas dicas, antes de viajar. Tanto no Brasil, quanto no exterior. Parabéns!!
Quanto ao Jalapão, você tem alguma sugestão de companhia aérea, para Palmas?
Muito obrigado.
Grande abraço.
Olá, Raffael! A malha aérea do Brasil está bem reduzida por causa da pandemia. Descubra as melhores rotas e os menores preços da sua cidade a Palmas no nosso parceiro Kayak.
Boa tarde! Gostaria de ser informado, se para o mês de abril de 2021, já tem disponibilidade de datas de saída para excursão ao Jalapão, para um período de 6 dias? Pois é de meu interesse conhecer.
Solicito, brevidade na resposta que a passagem aérea, tem que ser solicitada na Gol até dia 28 de julho! Fico no aguardo da sua resposta
Atenciosamente
Antônio Carlos
Olá, Antônio! Somos apenas um blog. Procure a Korubo ou um agente de viagem!
Gostaria de mais informações, qual o valor atual do pacote, de Minas Gerais saem voos diretos?
Se caso eu nao quiser participar da escalada tem algum local com águas para ficar?
Olá, Glace! Somos apenas um blog. Entre em contato com a Korubo ou peça ajuda a um agente de viagem.