Chiloé: uma viagem no tempo (e por cenários de Isabel Allende) à ilha Mechuque
Um dos passeios possíveis para quem visita o arquipélago de Chiloé, no Chile, é conhecer a ilha Mechuque, parte das Ilhas Chauques. A jornada, que vai envolver transporte terrestre e marítimo, é quase uma viagem no tempo.
Como estava hospedada no Tierra Chiloé, minha visita foi toda organizada por eles.
A primeira parada é o povoado de Tenaún, o primeiro local em que os espanhóis desembarcaram na área, centenas de anos atrás. Pequenino, o lugar ainda guarda características de outras épocas, seja em suas casas e ruas quanto em sua igreja de madeira, a Iglesia de Nuestra Señora del Patrocinio, Patrimônio da Humanidade pela Unesco (e sobre a qual você lerá mais em breve).
Já na placa da principal praça do vilarejo fica clara a importância do folclore local. Junto de datas históricas está a época em que teria acontecido o embate entre a bruxa Chillpila e o explorador espanhol José de Moraleda. Conta a história que Moraleda desafiou a feiticeira para um duelo, mas perdeu quando ela mudou o sentido das marés, fazendo com que o navio do europeu ficasse encalhado. Segundo nossa guia, provavelmente Chillpila sabia precisar quando o movimento das águas acontecia e se aproveitou disso para se impor ao explorador.
É da enseada de Tenaún que sai o barco Williche, construído especialmente para o hotel pelos carpinteiros locais, usando o estilo e os materiais tradicionais dos estaleiros da ilha (o barco é todo feito de madeira). Com capacidade para até 30 pessoas, a embarcação conta com banheiro, quarto e cozinha na parte inferior, e bar, uma ampla “sala de estar”, com poltronas e mesa em que são servidas várias comidinhas (e que praticamente não fica vazia durante todo o trajeto, tanto de ida quanto de volta), além da sala de controle e das laterais abertas, de onde é possível sair para fazer fotos ou simplesmente curtir o ventinho gelado enquanto outros barcos pesqueiros passam, e outras ilhotas aparecem todas coloridinhas de amarelo (ao menos em setembro).
Menos de uma hora depois, navegando por canais, o Williche deixa os visitantes na ilha de Mechuque. Infelizmente, à primeira impressão não é legal por conta da grande quantidade de garrafas de plástico e outras embalagens de plástico no chão. Projetos ecológicos inspirando os próprios turistas a ajudarem a preservar o local estão em estudo.
Guias a postos, bastões para caminhadas distribuídos. A partir dali, a ideia é cruzar a ilha. Pode-se fazer o contorno dela de caiaque ou a pé. Fiz o trajeto andando: são aproximadamente 5 km, sendo o início da trilha uma subidinha considerável em que agradeci ao conselho de outra jornalista de não levar minha mochila junto (é possível deixar seus pertences no próprio barco). Uma vez passado esse começo mais pesado, o restante do percurso é mais plano e bem menos cansativo. E quando, lá no meio da caminhada, você se depara com esta vista, bom, quem se importa de ficar ofegante um tempo?
Do outro lado da ilha fica a vila de Mechuque, que só “funciona” de fato durante a temporada. No restante do ano, ainda que habitada, ela mais parece uma cidade fantasma. E o costume de colocar pequenas estátuas e outros enfeites nas janelas das casas ajuda ainda mais a dar o clima.
Casas (enfeitadas com tejuelas), alguns estabelecimentos comerciais e escola (que é um Monumento Nacional) vão aparecendo conforme se desbrava o povoado. Todo esse cenário envolto por muito verde, simpáticos cães que andam soltos pelo lugar e um ou outro morador que aparece para desejar boa tarde. Numa paradinha pelo caminho foi possível inclusive acompanhar, por alguns minutos, o trabalho de construção de um barco, próximo ao mar. O lugar também abriga o Museo de Don Paulino, que infelizmente não conseguimos visitar.
Descobri por comentários das fotos de Mechuque que entraram no Instagram do VnV (aliás, você já segue a gente? @viajenaviagem) que o vilarejo é cenário do livro “O Caderno de Maya”, de Isabel Allende. A protagonista da trama é enviada à ilha de Chiloé pela avó que a criou, a fim de fugir de um traficante de drogas com quem se envolveu.
Embarcados novamente no Williche, começamos a volta para o Tierra Chiloé, numa viagem que durou aproximadamente três horas. O porto, porém, é aquele que se vê da janela dos quartos, ou seja, com uma escadaria e uma pequena caminhada já se está novamente no hotel.
Heloísa viajou a convite do Tierra Chiloé.
Leia mais:
- Ilha de Chiloé: uma beleza bruta
- O luxo sereno do Tierra Chiloé
- Atacama com estilo: Tierra Atacama
- Torres del Paine: aos cuidados do Tierra Patagonia
- Dicas de Chiloé no Viaje na Viagem