‘Festando’ no Pantanal: o Arraial do Banho de São João, em Corumbá
“E aí, festou muito ontem?”, era como se cumprimentavam os moradores de Corumbá, Mato Grosso do Sul, em 24 de junho, dia de São João. A maior festa do Arraial do Banho de São João acontece sempre na véspera (o último de três dias seguidos de festejos), e envolve toda a cidade em uma ritual religioso tão alegre que mais parece um Réveillon.
No Porto Geral de Corumbá, todo enfeitado com bandeiras, a prefeitura organiza um corredor de barraquinhas onde são vendidas comidas típicas e monta um palco para apresentação de músicos populares. Isso já renderia uma festa e tanto, mas o que faz do arraiá de Corumbá uma das celebrações juninas mais singulares do Brasil são os seus festeiros.
Corumbá tem 92 festeiros oficialmente registrados. São pessoas que, por alguma bênção recebida, afinidade com o santo, ou promessa a pagar, ano após ano promovem festas dedicadas a São João Batista, ou a Xangô. Há festas que acontecem nos quintais das casas; outras que ocupam uma rua inteira. Festas católicas, do candomblé ou da umbanda. São todas abertas ao público, com música e comidas juninas, e a vizinhança comparece em peso para fazer seus agradecimentos e pedidos a São João.
Quando saímos para conhecer um dos principais festeiros de Corumbá, eu não esperava encontrar um rapazinho tão jovem, de 28 anos. Alfredo ainda era adolescente quando começou a organizar as festas que sua família tradicionalmente promovia. O que costumava ser uma reunião de poucas pessoas na sala, no tempo de seus avós, acabou crescendo e virando a comunidade festeira Monte Castelo. Não demorou para a casa precisar ser reformada para dar conta de acolher tantos devotos.
No quintal, Alfredo monta um altar bonito para São João Batista, e deixa as portas abertas para qualquer um que queira entrar e fazer a sua prece.
Do lado de fora, a farra é boa: enquanto as crianças brincam, os adultos tomam cerveja, e todos aproveitam os quitutes preparados pela família de Alfredo e pela vizinhança, que são oferecidos de graça. Cada um ajuda no que pode, e é grande o espírito de comunidade.
Tanto em festas mais intimistas, quanto em festanças como a do Alfredo, o grande momento da noite é quando o festeiro e sua comunidade descem em procissão em direção ao rio Paraguai, levando sua imagem de São João para ser banhada na pequena praia do Porto Geral.
Os andores, decorados com todo o capricho, desfilam pela cidade ao som do hino de São João, que é tocado por pequenos grupos de sopro e percussão em ritmo carnavalesco. Quando os andores alcançam o alto da Ladeira Cunha e Cruz, no centro histórico de Corumbá, são anunciados pelo locutor da festa, saudados pelo público, celebrados com rojões. Quem quer se casar aproveita para passar sete vezes por debaixo do andor, uma superstição para arranjar pretendentes. Crianças pulam pra lá e pra cá.
Ao fim da ladeira, as comunidades seguem com seus andores para a praia, e ali cada uma promove um animado batismo à pantaneira para sua imagem de São João.
Assistir ao sobe-e-desce dos andores pela ladeira é uma diversão só, e o desfile dura a noite inteira. À meia-noite tem queima de fogos e a festa do Porto Geral se encerra — mas, no dia seguinte, ainda tem repeteco nas comunidades de festeiros da umbanda e do candomblé, onde a festa é ainda maior no dia de Xangô.
Como participar do Arraial do Banho de São João
A festa oficial da cidade acontece todos os anos nos dias 21, 22 e 23 de junho no Porto Geral de Corumbá. Além das barracas com comidas típicas juninas e do Pantanal, há um calendário de atrações musicais, concurso de andores e apresentação de quadrilhas. A grande festa do banho de São João acontece sempre no dia 23 de junho.
Dos hotéis do centro (como o Santa Mônica e o Nacional) você consegue ir a pé para a Ladeira Cunha e Cruz, e também visitar a casa de alguns festeiros caminhando ou com uma curta corrida de táxi.
Os arraiás promovidos por festeiros no dia 23 são abertos a visitantes. Cada um funciona de uma maneira distinta: há festas gratuitas e festas pagas; há festas com comida de graça e outras onde se cobra pelos quitutes. A bebida é sempre paga.
A prefeitura tem uma lista com os endereços de todas as comunidades festeiras (de 2014), e neste site você pode conhecer um pouco mais sobre muitas delas. Entre as mais conhecidas estão a da rua Monte Castelo, a da Dona Concha e a da Tenda Espírita Umbandista Caboclo Estrela do Norte (ou Tenda da Dona Carlinda). Também vale a pena passar na festa do Instituto Luis de Albuquerque (ILA), um centro cultural que fica bem próximo ao porto e de onde sai o andor da prefeitura. Com dois dedos de prosa por onde você passar pela cidade não vai ser difícil conseguir mais indicações.
Mariana viajou a convite da Fundação de Turismo do Pantanal.
Leia mais:
2 comentários
Terra simples, povo simples que fazem um festão danado de bom🌾
Ai, que vontade de conhecer esses festejos!