Kreuzberg, Neukölln, Tempelhof, City-West: Berlim, de volta para o Ocidente
Colaborou | Natalie Soares
Passados 25 anos da queda do Muro, Berlim ainda não parou de se transformar. Os antigos lados ocidental e oriental parecem atuar como placas tectônicas que seguem movendo a cidade pra lá e pra cá.
O Muro existia para conter a fuga do território comunista para o capitalista. Sua derrubada, porém, provocou o efeito contrário: foi o Ocidente que invadiu o Leste. Primeiro foram os artistas squatters que tomaram edifícios em Mitte. No rastro deles, jovens profissionais descobriram as ruas arborizadas de Prenzlauer Berg, onde predinhos dilapidados começaram a ser reformados.
A valorização imobiliária, porém, acabou expulsando os pioneiros. Mitte se transformou no centro comercial sofisticado de Berlim, e Prenzlauer Berg, no bairro que detém o metro quadrado mais caro entre as áreas residenciais.
Com o antigo Leste estabilizado, a cidade passou a assistir ao renascimento da banda ocidental. Cinco anos atrás, dava para ir a Berlim e não sair da parte oriental, que você não perderia (quase) nada. Hoje, porém, nenhuma visita será completa sem curtir Kreuzberg, Neukölln/Kreuzkölln e Tempelhof, ou descobrir as novidades do entorno da Ku’damm, agora apelidado de City-West.
Kreuzberg, alternativo e diverso
O epicentro da Berlim alternativa voltou a se reacomodar em Kreuzberg, o bairro de imigrantes turcos que era periférico antes da queda do Muro mas que hoje está a meio caminho entre as antigas metades da cidade.
Mais do que qualquer outra parte da cidade, Kreuzberg parece ter vocação para mudanças demográficas. Os turcos chegaram aos milhares nos anos 60, trazidos por um programa econômico que incentivava a vinda de mão-de-obra estrangeira.
As mesmas condições que fizeram os turcos se radicar em Kreuzberg – os preços baixos proporcionados pela proximidade quase insalubre do Muro – também atraíram hippies e doidões. Essa diversidade que já existia acabou servindo de combustível para o novo boom do bairro.
Além dos turcos e dos alternativos — que nunca deixaram o bairro — hoje Kreuzberg é um catalisador da nova economia, funcionando como incubadora de muitas empresas digitais (dessas que aceitam bitcoin como meio de pagamento).
Seus apartamentos antigos, em predinhos art-noveau poupados dos bombardeios da Segunda Guerra, passaram a chamar a atenção da classe média. A primeira feira gastronômica moderninha da cidade se instalou num antigo mercado do bairro, o Markthalle 9.
A vida noturna de Kreuzberg é eclética e democrática. Não tem erro: desça na estação Kottbusser Tor (linha U1) e caminhe uma quadra até a Oranienstasse — duvido que você não ache um lugarzinho para chamar de seu.
Meus favoritos: os cafés Luzia (Oranienstrasse 34) e Bateau Ivre (Oranienstrasse 18 ), o mexicano Santa Maria (Oranienstrasse 170) e o bar de vinhos Ottorink (Desdener Strasse 124). Querendo experimentar um Döner Kebab (o churrasquinho grego dos turcos) de primeira grandeza, pegue uma mesa no Hasir (Adalberstrasse 10, aberto 24 horas), que se apresenta como introdutor do prato na cidade. Na mesma rua, o libanês Maroush (Adalbertstrasse 19) é outro ícone gastronômico das antigas.
A cena mais alternativa resiste para as bandas da estação Schlesisches Tor (linha U1).
Os graffitis mais bacanas do bairro podem ser vistos ao longo da Schlesische Strasse, que leva à zona de Treptow, em cujos canais se escondem clubes cultuados como o Club der Visionäre (tel. 030/6951-8942) e Arena Berlin (onde no verão funciona um bar-piscina, o Badeschiff) e o restaurante Freischwimmer (tel. 030/6107-4309).
A muvuca vai além da fronteira: já faz muito tempo que a aura boêmia de Kreuzberg se alastrou até o bairro vizinho de Friedrischshain, no lado antigo oriental, ponto final da última estação da linha 1 do metrô (Warschauer Strasse, U1).
Por ali está o mais célebre clube berlinense, o templo do techno Berghain, que funciona numa antiga usina nuclear abandonada (Rüdesdorfer Strasse 70, tel. 030/2936-0210, metrô U1 Warschauer Strasse ou U5 Weberwiese).
Numa noite de verão, o miolinho da muvuca de Friedrischshain (Simon-Dach-Strasse, Revaler Strasse; metrô U1 Warschauer Strasse) não fica muito diferente da Vila Madalena durante a Copa.
Mas Kreuzberg não é só festa. O bairro também tem atrações diurnas que devem constar do roteiro até do mais comportado dos turistas. Estão por ali o interessantíssimo museu privado do Checkpoint Charlie (Friedrischstrasse 43-45, metrô U6 Kochstrasse; aberto diariamente das 9h às 22h) e o tocante Museu Judaico (Lindenstrasse 9-14, metrô U6 Kochstrasse ou U1 Hallesches Tor; aberto diariamente das 10h às 20h).
Outros bons museus da área são a Galeria Berlinense (Alte Jakobstrasse 124-128, metrô U6 Kochstrasse; fechada para reforma, reabre dia 29/5/2015) e o Museu Alemão de Tecnologia (Trebiner Strasse 9, metrô U1 Möckernbrücke; aberto de 3ª a domingo das 10h às 17h30).
Tecnicamente em Friedrischshain — porque está do outro lado do Spree –, a East Side Gallery (Muhlandstrasse, metrô U1 Warschauer Strasse), um pedaço do Muro que não foi derrubado e que preserva os graffitis daquela época, é um ótimo começou ou término para um tour do bairro. (A propósito, a 02 Arena, palco de megashows, fica nos fundos da East Side Gallery).
Onde se hospedar em Kreuzberg
Kreuzberg não é um pólo hoteleiro. O Motel One Berlin Mitte, apesar de ter Mitte no nome, fica a três quadras da muvuca da Oranienstrasse. O NH Berlin Heinrich Heine também não fica (muito) longe.
Viajar ao exterior com segurança é ter Seguro Viagem Bradesco.
O hotel/hostel baxpax é meio esculhambado, mas tem a cara do bairro e é vizinho à estação Görlitzer Bahnhof do metrô U1. O hotel mais emblemático de Kreuzberg, porém, é o Die Fabrik, na Schlesische Strasse a caminho dos canais de Treptow; as reservas só são feitas por email e os pagamentos, em dinheiro vivo.
Já em Friederischshain, perto da estação Warschauer Strasse, das baladas e da 02 Arena, escolha entre os descolados Michelberger, Plus Berlin, nhow Berlin e Industriepalast e o careta Holiday Inn Berlin East Side (em frente à O2 Arena). Mais adiante, o miolinho de Friedrischshain é coalhado de hostels e pequenos hotéis, como o famoso Ostel e o Almodóvar BioHotel.
- Feiras gastronômicas em Berlim: Markthalle 9 e Village Market
- Michelberger e mais dois hotéis superdescolados em Berlim
Neukölln e Kreuzkölln: Brooklyn em Berlim
Nas minhas quatro idas anteriores a Berlim, entre 1989 e 2008, nunca tinha chegado nem perto de Neukölln, um bairro desprovido de atrações convencionais e fora do eixo turístico da cidade. Mas em Berlim é assim: de onde menos se espera é que aparecem as novidades.
Nos últimos anos, Neukölln despontou como a hipsterlândia da vez. Já é clichê comparar Neukölln a Williamsburg, o pedacinho mais cool do Brooklyn nova-iorquino — mas, de fato, o bairro tem uma importante colônia de americanos transplantados de Nova York.
A estação de metrô que leva ao coração de Neukölln é a Hermannplatz (linhas U7 e U8 ). Dali é fácil pegar a Weserstrasse, uma mina de lojinhas bacanas (muitas delas funcionando também como cafés). Preste atenção nas roupas vintage da Down by Retro (Weserstrasse 189), na loja de vinis da Bass Cadet Records (também no nº 189), na dupla de brechós Let them eat cake e Oh Mini I Am (nº 164), na loja multiconceitual Ututut (nº 53). Vegetarianos e veganos vão querer anotar a dica do bistrô Let it Be (esquina com Treptowerstrasse).
A transversal Pannierstrasse é o corredor de restaurantes de Neukölln. Meio mundo faz fila no Berlinburger International (BBI), uma portinha de onde saem os hambúrgueres mais cultuados da cidade (Panniestrasse 5). Um bar/restaurante muito charmoso, com antipasti italianos, é o Bruch (Pannierstrasse 57).
O bairro fica mais charmoso na parte de cima (norte), ao longo do canal Landwehr.
Por estar na transição de Kreuzberg para Neukölln, esta área acabou ganhando o apelido de Kreuzkölln. A mesma estação que serve a parte de cima de Kreuzberg, Kottbusser Tor, também serve para Kreuzkölln: basta tomar a direção oposta (em vez de pegar a Adalberstrasse para chegar à Oranienstrasse, pegue a Admiralstrasse até o canal.
Ao longo do canal a atmosfera — pelo menos no verão — lembra a do Canal St.-Martin de Paris. com a garotada batendo ponto na ponte Admiral (Admiralbrücke).
Os melhores dias para passear são terça e sexta, quando acontece o Mercado Turco na Maybachufer (a margem sul do canal), das 10h às 18h.
Alguns lugares gostosos desta margem: o italiano Il Casolare (Grimmstrasse 30, em frente à Admiralbrücke), o bar Ankerklause (esquina com Kottbusser Damm, debruçado no canal, em frente ao mercado turco) e o mediterrâneo-tunisiano Café Jacques (Maybachufer 14, tel. 030/69-41048 ).
Ainda na parte de baixo do canal, dê um pulinho na kneipe Bei Schlawinschen (Schönleinstrasse 34), um autêntico botequim berlinense, com o ambiente kitsch totalmente preservado. Para sobremesa, passe na Fräulein Frost (Friedelstrasse 38 ), que tem sabores inusitados, como… gorgonzola (eu adorei).
Ah, sim: um dos restaurantes mais badalados da cidade também está (mais ou menos) por ali, o contemporâneo Herz & Niere (Fichtestrasse 31, tel. 030/6900-1522).
A margem de cima do canal, passando a Kottbusser Damm, tem uma fileira de restaurantes charmosos (e bem mais mauricinhos do que os da banda de baixo). O austríaco Horváth (Paul-Linke-Ufer 44a, tel. 030/6128-9992) tem comida de autor com menu degustação; os informais Chan Thai Market e Cocolo Ramen (Paul-Linke-Ufer 39, tel. 030/9833-9073) servem ótima cozinha asiática.
Onde se hospedar em Neukölln/Kreuzkölln
O Prenz Berlin é o mais bem localizado da região: fica perto do canal Landwehr e do mercado turco; Kreuzberg está a uma curta caminhada. O hotel mais excêntrico do bairro (talvez da cidade) é o Hüttenpalast, onde os quartos são antigos trailers alemães-orientais. Mais embaixo, em Neukölln mais profundo, considere o Hotel am Hermannnplatz e o Days Inn Berlin City South.
Tempelhof
Ironicamente, a transformação urbana mais radical dos últimos tempos em Berlim aconteceu no antigo lado ocidental.
Desativado desde 2008, o antigo aeroporto de Tempelhof — célebre por ter sido palco da ponte-aérea de socorro (a airlift) a Berlim Ocidental nos meses que se seguiram à construção do Muro — andava totalmente abandonado, à espera de uma decisão sobre o seu uso para projetos imobiliários.
Até que moradores dos arredores começaram a plantar (ilegalmente) hortas e fazer um jardim comunitário numa de suas bordas. A cidade entendeu o recado e votou para fazer do aeroporto um parque.
Sem paisagismo: as pistas originais são aproveitadas agora para andar de bicicleta, skate e prancha a vela; os canteiros viraram mato ou passaram a ser cultivados por um coletivo de moradores das redondezas. No fim de semana, berlinenses de todas as etnias se mudam para lá, com suas famílias, brinquedinhos e… churrasqueiras portáteis.
City West, a nova Ku’damm
Depois de uma década de acomodação, a região da Kurfürstendamm, a tradicional avenida chique do lado Oeste, reage para voltar a rivalizar com Mitte. O antigo centro de Berlim Ocidental agora atende pelo nome de City-West.
Uma galeria dos anos 50, a Bikini Haus, foi transformada num shopping-conceito, onde as lojas são contêineres envidraçados, ocupados por marcas de vanguarda (Budapester Strasse 40; metrô Zoo, linhas U1, U2 e U9).
Anexo ao shopping funciona o hotel-design 25 Hours Bikini, cujos quartos dos fundos têm vidro do chão ao teto, com vista para o zoológico. Seus hóspedes têm o privilégio de subir por um elevador interno ao Monkey Bar, o ultraconcorrido bar da cobertura.
O outro jeito de subir sem fila é fazendo uma reserva no restaurante Neni, de comida israelense, que compartilha o terraço.
Depois de quase uma década fechado, o prédio histórico da Amerika Haus reabriu como a sede da C/O Berlin, uma das mais importantes galerias do planeta dedicadas à fotografia (Hardenbergerstrasse 22; metrô Zoo, linhas U1, U2 e U9).
Três outras atrações da região são do tempo da cidade dividida. A Igreja Memorial do Kaiser Guilherme é um cartão-postal quase tão importante quanto o Portão de Brandemburgo; o fato de não ter sido reconstruída funciona como um poderosíssimo lembrete do que foi a Segunda Guerra.
A loja de departamento KaDeWe (Kaufhaus des Westens, ou “Loja do Ocidente”) perdeu um pouco de seu glamour; já existe uma Galeries Lafayette em Mitte, e as feiras gastronômicas já são mais interessantes do que o famosíssmo 6º andar da loja, onde se pode experimentar comida do mundo inteiro.
De todo modo, vale visitar a loja que já foi símbolo da opulência do capitalismo (Tauentzienstrasse 21, metrô Wittenbergplatz, linhas U1, U2 e U3). O Zoológico também pode valer a visita — sobretudo no verão, quando funciona um gostosíssimo Biergarten (metrô Zoo, linhas U1, U2 e U9).
Uma quarta atração imperdível de Berlim Ocidental fica fora de City-West: é o Palácio de Charlottenburg (aberto de 3ª a domingo das 10h às 17h; metrô Richard-Wagner-Platz, linha U7).
Onde se hospedar em City-West
A região nunca deixou de ser uma das zonas hoteleiras mais importantes da cidade. As duas estrelas do momento são o moderninho 25 Hours Bikini, em frente à Igreja Memorial do Kaiser Guilherme, e o luxuoso Waldorf Astoria Berlin, o primeiro 5 estrelas a se instalar no antigo lado ocidental depois da reunificação.
O Crowne Plaza Berlin City Center e os econômicos Sorat Ambassador e Ibis Berlin Kurfürstendamm ficam próximos à estação Wittenbergplatz, servida pelas linhas U1 (que leva a Kreuzberg) e U2 (que vai a Berlim Oriental). Já os básicos-moderninhos Aletto, Indigo e Motel One Berlin Ku’damm ficam pertinho da estação Zoologischer Garten, onde passa o metrô U2 (a Berlim Oriental).
Ricardo Freire viajou a convite do Turismo da Alemanha
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13 comentários
E pensar que eu cheguei no blog em 2007 por conta de um post chamado Berlin para a aluna da Mira. Um dia volto mas não deixo de voltar aqui para qualquer viagem, tal qual a instrutora do curso que fiz hoje falou rs
Berlim é uma cidade espectacular. São várias “cidades” dentro da cidade. Muitas facetas de uma metrópole contemporânea, mas cheia de história.
Adorei o texto e dicas! Espero aproveitá-los.
Só queria agradecer pela excelente matéria. Acabei de me mudar para Berlim e me deu uma visão muito boa sobre a cidade.
Belo lugar para se conhecer.
Ola …estarei em Berlim agora em Março, adorei as dicas e gostaria de algumas sobre Dresden faremos bate volta. Li tb sobre o post de Jungfrau em Interlaken, estu com varias duvidas, saindo de Zurich para interlakn ost chegando la posso comprar subir por trem? quero tb andar no teleferico como fazer ? e tem opcao de roupas de neve para alugar ? se puder me mandar um email agradeco. obrigada.
Olá, Ana Luiza!
Leia sobre o bate-volta a Dresden:
https://www.viajenaviagem.com/2015/01/dresden-bate-volta-berlim-pit-stop-praga-roteiro
Leia sobre a Junfraubahn:
https://www.viajenaviagem.com/2011/09/de-interlaken-ao-top-of-europe-pela-jungfraubahn
Nosso site é de consulta, infelizmente não temos como responder por email.
Arrasaram nesse roteiro! Estive em Berlim há alguns meses e voltei apaixonada, a cidade está numa fase muito boa 🙂
Adorei conhecer um pouco dessas regiões de Berlin. A cidade realmente me parece incrível.
Ótimo artigo, adoro Berlin mas ainda tenho muita coisa para conhecer. Já que o tempo é de economia, deixo uma sugestão de apartamentos para alugar. Já fiquei 2 vezes e economizei bastante com ótima localização e conforto. É Sommer Pension: https://www.sommerpension.de/
Oi, Ricardo e bóia!
Adorei o post, mais dicas pra adicionar ao meu roteiro em Berlim!!!!
Ainda aguardo ansiosa o post de Hannover :p
Abraços,
Izabella
Olá, Izabella! O post de Hannover foi publicado já há um tempinho:
https://www.viajenaviagem.com/2014/12/hannover-feira-passeios-dicas/
Muito obrigada!!!!
Olho aqui sempre pra ver os novos posts, mas esse saiu quando eu tava viajando rsrs
Vai me ajudar demais!
Beijos,
Izabella