8 coisas que ninguém ainda falou sobre a Copa
1 | Precisamos de aeroportos renovados — mas não por causa da Copa
O boom do tráfego aéreo no Brasil nos últimos 10 anos já fazia necessária a renovação dos aeroportos há muito tempo. Graças à Copa, finalmente começou-se (aos 38 do segundo tempo) o processo de privatização dos aeroportos, dando fim ao monopólio da arqui-incompetente Infraero. Para a Copa, no entanto, o que temos dará muito bem para o gasto. O tráfego aéreo durante o campeonato deve diminuir, e não aumentar, devido à paradeira das viagens a trabalho.
O maior problema de deslocamento na Copa envolve a logística dos jogos eliminatórios, quando muitos torcedores terão que comprar passagens de última hora para um mesmo destino que só será conhecido ao fim da fase de grupos. Mas a solução para esse perrengue é adaptação da malha aérea aos trajetos das torcidas das seleções classificadas (para atender a quem tenha comprado carnês de ingressos acompanhando seleções).
2 | A obra que precisamos nos aeroportos: triplicar os guichês da imigração em Cumbica e no Galeão
Não somos o único país que deixa os recém-chegados esperando duas horas na fila da imigração (os Estados Unidos nos brindam com essa experiência a cada visita). Agora: seria muito simpático, além de razoavelmente fácil (e, suponho, barato) aumentar os postos de atendimento na chegada dos nossos dois principais aeroportos internacionais.
3 | Precisamos de melhor mobilidade urbana — mas não por causa da Copa
Não há grande cidade brasileira que não precise urgentemente melhorar o transporte urbano. Nenhuma vai conseguir isso até a Copa (a maioria nem tentou).
Mas isso não é nenhuma catástrofe. Em cada cidade, a Copa do Mundo acontece em quatro, cinco ou seis dias estanques, espalhados num período de 20 a 30 dias. Nesses dias específicos, as cidades funcionarão em ritmo de feriado, com trânsito de domingo. Assim como quem vai a um show da Madonna, a uma corrida de Fórmula 1 ou a um festival tipo Rock in Rio ou Lollapalooza, quem vai a um jogo da Copa sabe que pode perder o dia nessa função. (Eu fiquei quase três horas no trânsito de Los Angeles para a final da Copa de 1994 e sobrevivi. Outro dia mesmo a final do Superbowl em New Jersey trouxe caos viário às redondezas de Nova York.)
Os estádios de Porto Alegre, Curitiba, Rio, Belo Horizonte, Salvador e Fortaleza têm um histórico de lotação máxima em jogos decisivos e a questão da mobilidade urbana padrãozinho CBF nunca foi esse problemão todo. O mais triste nesta questão da mobilidade é a dinheirama que se está gastando para melhorar o acesso viário para carros particulares aos estádios. Mais do que um desperdício, é um retrocesso.
(Já para a Olimpíada, sim, mobilidade urbana padrão COI é essencial. Uma cidade inteira vai estar envolvida durante 30 dias numa competição que acontece o dia inteiro, em diversos pontos. Ou o transporte público funciona, ou vai ser trágico.)
4 | A obra que precisamos nos estádios: conexão à internet
Anote aí: vai ter algum mimimi sobre a dificuldade de deslocamento e entrada nos estádios, mas a grita mesmo vai ser sobre a dificuldade de conexão à internet. Esta deveria ser a primeira Copa do Mundo do Facebook e do Instagram, mas pelo que andei lendo a probabilidade de haver internet para todos nos estádios é mínima. Uma pena. Pela fração do custo de um viaduto inútil essa obra poderia ter sido feita.
5 | Copa e Olimpíada são ações de marketing
Em algum momento o governo vendeu à opinião pública a idéia de que a Copa é um evento com “função social”, que serviria para melhorar imediatamente a vida do povo brasileiro. Não é. As obras feitas para a Copa é que poderiam beneficiar imediatamente o povo brasileiro, caso tivessem sido feitas com competência (e não tivessem inventado estádios que serão inúteis, como os de Cuiabá, Manaus e Brasília, ou em lugares que não precisariam de mais um estádio, como Recife e São Paulo). Mas o evento Copa do Mundo se justifica como promoção comercial do Brasil.
Mais: a seqüência Copa do Mundo-Olimpíada, conseguida graças ao carisma do presidente Lula, configura o mais espetacular plano de mídia já comprado por um país emergente desde o México de 68-70 [obrigado pela correção, Márcio Antônio]. Num espaço de dois anos, o Brasil vai estar dois meses inteiros na tela das TVs do mundo inteiro. Um evento reforçará o outro. Nunca antes na história deste país houve uma oportunidade como esta para conquistar corações, mentes e bolsos em escala mundial.
Os elefantes brancos padrão Fifa da Copa, as obras mequetrefes do Pan e todas as roubalheiras federais, estaduais e municipais, de todos os partidos, são o preço a pagar por essa mídia que poucos já conseguiram “comprar” (e cujo preço é impossível estimar).
Precisamos dessa mídia? Durante 60 dias, e com muitos repiques ao longo de dois anos, o Brasil será posto no mapa de bilhões de pessoas que conhecem pouco ou nada de nós. (Não ache que o Brasil seja conhecido pelo que sai no noticiário de economia dos jornais. Este público é uma fração muito pequena dos nossos clientes potenciais.)
Para um país cujas marcas e hábitos culturais são absolutamente desconhecidos, e cujo turismo internacional é pífio e está muitíssimo aquém das possibilidades, esta é uma oportunidade espetacular. Até o momento, porém, não parece haver nenhum plano para aproveitar a ocasião de maneira mais efetiva.
6 | Compramos a mídia, mas esquecemos de fazer a campanha
Todos os anfitriões das últimas Copas e Olimpíadas se prepararam para mostrar ao mundo uma nova imagem de seus países e cidades. A Alemanha estendeu o tapete vermelho e se preocupou em ganhar o campeonato da hospitalidade, tornando-se um país mais quente e amigável aos olhos dos visitantes. A China usou a Olimpíada de Pequim para se posicionar como nova potência mundial. A Africa do Sul fez da sua Copa a vitrine de um país reunificado consigo mesmo. A Olimpíada de Londres foi usada como gancho para uma campanha de rejuvenescimento da imagem do Reino Unido, de olho em fazer crescer o turismo no país como um todo.
O Brasil chega às vésperas da sua Copa mais focado em montar um plano para conter manifestações de rua do que em pôr em prática um plano para promover o país de forma consistente antes, durante e depois da Copa. Vamos ocupar nosso espaço de mídia não com uma campanha publicitária, mas com um reality show. Não acho que isso vá ser catastrófico, não — o cenário é bonito, o elenco é animado e o saldo do que apresentaremos será positivo. Mas que poderíamos ter aproveitado a chance muito melhor, ah, poderíamos.
(O Brasil não teve competência para fazer sequer um site de destino próprio. Alguma mente brilhante na Embratur teve a idéia de terceirizar o trabalho para o TripAdvisor — e hoje o site de turismo do Brasil é um mashup histérico e bagunçado de resenhas de viajantes, fotos do Instagram e vídeos do Youtube. Aquilo que seria um ótimo apêndice 2.0 a um guia de verdade virou o conteúdo principal do site. Em vez de organizar o conteúdo esparso disponível na internet — que deveria ser a função de um site oficial de destino — o Visit Brasil [com s!] amplifica o caos informativo do TripAdvisor. Neste momento, por exemplo, a terceira principal atração turística do Brasil, classificada pelo TripAdvisor e sancionada pela Embratur, é um certo Shambhala Asian Day Spa, no Rio de Janeiro.)
7 | Perdemos a chance de fazer uma Copa como a da Alemanha
A Alemanha fez a Copa dos sem-ingresso: convidou o mundo para um mês de celebração na Alemanha, proporcionando festas de rua, criando um passe de transporte e uma rede de hospedagem domiciliar pela internet (em 2006!). O Brasil teria tudo para fazer algo parecido, porque a festa aqui é bacana durante toda e qualquer Copa, no país inteiro. Em vez de convidar o mundo para celebrar o espírito da Copa pelo Brasil afora, nos limitamos a vincular a divulgação do Brasil às cidades-sede, que não precisam de propaganda (estarão naturalmente lotadas, caras e conturbadas). Resultado: os destinos que não sediarão jogos da Copa estarão batendo lata durante o evento, em plenas férias escolares. E perderemos a magnífica chance de dar o pontapé inicial para deslanchar o turismo internacional já durante a Copa.
8 | Ainda assim, acredite: valerá a pena
Por mais problemas que eu veja, continuo otimista. Acho que faremos uma linda Copa — o que é diferente de uma Copa sem problemas. Acredito que a maioria dos estrangeiros esteja careca de saber que não está vindo para a Suíça. É provável que muitos venham com uma expectativa tão baixa com relação à eficiência e à segurança, que acabem se surpreendendo positivamente. (Isso aparece com freqüência em pesquisas de opinião com turistas.)
Por causa do nosso tamanho, da nossa população, do nosso crescimento econômico recente, da nossa importância entre os emergentes e da nossa insularidade, temos a falsa impressão de que o mundo conhece o Brasil e fala do Brasil. Não é verdade. A Copa e a Olimpíada em seqüência vão colocar o Brasil em outro patamar. E, mesmo tendo feito quase tudo errado, vamos acabar lucrando com isso. (#dsclp)
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Eu avisei: #VaiTerPromoçãoNaCopa
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Comentários
metro até a Luz e de lá o expresso Copa. acho…rs
Queridos Riq e Boia, voces saberiam dizer qual a melhor maneira de chegar ao estadio Itaquerao?
Vamos assistir ao jogo dia 23/6 ( Chile X Holanda), 13horas e provavelmente ficaremos no Ibis da av Paulista.
Ana Claudia, é a como a Val disse: o meio de transporte indicado é o Expresso da Copa, trens da CPTM que saem da estação Luz e fazem o trajeto sem paradas até as proximidades da Arena Corinthians.
Estando no Ibis da Paulista, vocês podem pegar um táxi até a estação da Luz (deve dar entre R$ 15 e R$ 20)ou pegar a linha 4 do metrô na estação Paulista (vizinha ao Ibis Budget da Consolação), que termina na Luz (apenas duas paradas).
Riq querido, muito obrigada!
Saudades de voces.
Beijos
Olá, Ana Claudia! Dá pra ir de metrô.
Fui à Copa da Alemanha. Vou contar como uma pessoa comum, somente a minha opinião. Tudo muito organizado, neste aspecto era para ser imitado deveras. MAS espero que não seja como lá, para quem está pagando. Não tenho mais interesse de ir a outras copas. Sem energia, sem paixão, sem emoção. Nos estádios tudo muito parado, sem torcida, frio de sentimento. Quem foi que disse que só se anda no Brasil… E quem disse que tem informacao em inglês em todo canto. Andei 1 km para chegar ao estádio e 1 km para voltar. Ainda deu para ver a Merkel passando com batedores e rindo dentro do carro oficial de alguma piada muito boa, porque foi a coisa mais alegre e interessante que vi em toda a copa. E a gente ali do lado andando e andando… Final feia.
Que delícia ler este texto. Chega a dar um alívio. Obrigada.